quarta-feira, 16 de junho de 2010

Um documentarista se dirige a cientistas

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antes de qualquer coisa, aqui vai o link para a postagem original de onde retirei o texto a seguir:
http://www.google.com/buzz/111317415064980211526/Bk3RQMAt81U/A-Assun%C3%A7%C3%A3o-mandou-um-e-mail-aqui-pro-pessoal
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O texto é longo, mas vale a pena ler...
Após o fim dele, tem um comentário meu.




"Publicado na Folha de São Paulo, dia 6 de junho de 2010
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Um documentarista se dirige a cientistas

Arte, ciência e desenvolvimento

RESUMO Neste ensaio, derivado de uma participação do documentarista João
Moreira Salles em simpósio da Academia Brasileira de Ciências,
discute-se a hipervalorização das artes e humanidades em detrimento das
ciências “duras” e da engenharia, e as consequên- cias do processo para
o desenvolvimento tecnológico, científico e cultural do país.

JOÃO MOREIRA SALLES

Agradeço ao professor Jacob Palis, presidente da Academia Brasileira de
Ciências, o convite que me fez para falar a uma plateia de colegas seus,
na crença de que eu pudesse servir de porta-voz das humanidades num
encontro de cientistas. Peço desculpas por desapontá-lo.
Sou ligado ao cinema documental e, mais recentemente, ao jornalismo,
atividades que, se não são propriamente artísticas, decerto existem na
fronteira da criação. Jornalismo não é literatura nem documentário é
cinema de ficção. Nosso capital simbólico é muito menor e nosso
horizonte de possibilidades é limitado pelos constrangimentos do mundo
concreto.

Não podemos voar tanto, e essa é a primeira razão pela qual, com
notáveis exceções, o que produzimos é efêmero, sem grande chance de
permanência. Não obstante, é fato que minhas afinidades pessoais e
profissionais estão muito mais próximas de um livro ou de um filme do
que de uma equação diferencial -o que não me impede de achar que há um
limite para a quantidade de escritores, cineastas e bacharéis em letras
que um país é capaz de sustentar.

Isso deve valer também para sociólogos, cientistas políticos e
economistas, mas deixo a suspeita por conta deles. Na minha área, creio
que já ultrapassamos o teto há muito tempo, e me pergunto de quem é a
responsabilidade. Em 1959, o físico e escritor inglês C.P. Snow deu uma
famosa palestra na Universidade de Cambridge sobre a relação entre as
ciências e as humanidades. Snow observou que a vida intelectual do
Ocidente havia se partido ao meio.

De um lado, o mundo dos cientistas; do outro, a comunidade dos homens de
letras, representada por indivíduos comumente chamados de intelectuais,
termo que, segundo Snow, fora sequestrado pelas humanidades e pelas
ciências sociais. As características de cada grupo seriam bem
peculiares. Enquanto artistas tenderiam ao pessimismo, cientistas seriam
otimistas.

Aos artistas, interessaria refletir sobre a precariedade da condição
humana e sobre o drama do indivíduo no mundo. O interesse dos
cientistas, por sua vez, seria decifrar os segredos do mundo natural e,
se possível, fazer as coisas funcionarem. Como frequentemente obtinham
sucesso, não viam nenhum despropósito na noção de progresso.

Estava estabelecida a ruptura: de um lado, o desconforto existencial,
agravado pela perspectiva da aniquilação nuclear; do outro, a
penicilina, o motor a combustão e o raio-X. Na qualidade de cientista e
homem de letras, Snow se movia pelos dois mundos, cumprindo um trajeto
que se tornava cada vez mais penoso e solitário.

“Eu sentia que transitava entre dois grupos que já não se comunicavam”,
escreveu. Certa vez, um amigo seu, cidadão emérito das humanidades, foi
convidado para um daqueles jantares solenes que as universidades
inglesas cultivam com tanto gosto. Sentando-se a uma mesa no Trinity
College -onde Newton viveu e onde descobriu as leis da mecânica
clássica- e feitas as apresentações formais, o amigo se virou para a
direita e tentou entabular conversa com o senhor ao lado.

Recebeu um grunhido como resposta. Sem deixar a peteca cair, virou-se
para o lado oposto e repetiu a tentativa com o professor à sua esquerda.
Foi acolhido com novos e eloquentes grunhidos.
Acostumado ao breviário mínimo da cortesia -segundo o qual não se ignora
solenemente um vizinho de mesa-, o amigo de Snow se desconcertou, sendo
então socorrido pelo decano da faculdade, que esclareceu: “Ah, aqueles
são os matemáticos.

Nós nunca conversamos com eles”. Snow concluiu que a falta de diálogo
fazia mais do que partir o mundo em dois. A especialização criava novos
subgrupos, gerando células cada vez menores que preferiam conversar
apenas entre si.

SÍNTESE E ORDEM Não sei se alguém já voltou a conversar com os
matemáticos. Torço para que sim, apesar das evidências em contrário.
Seria um desperdício, pois a matemática, para além dos seus usos, é
guiada por um componente estético, por um conceito de beleza e de
elegância que a maioria das pessoas desconhece.

O que move os grandes matemáticos e os grandes artistas, desconfio, é um
sentimento muito semelhante de síntese e ordem. Os dois grupos teriam
muito a dizer um ao outro, mas, até onde sei, quase não se falam. (No
passado, o poeta Paul Valéry deu conferências para matemáticos e o
matemático Henri Poincaré falou para poetas.)

Segundo Snow, com a notável exceção da música, não há muito espaço para
as artes na cultura científica: “Discos. Algumas fotografias coloridas.
O ouvido, às vezes o olho. Poucos livros, quase nenhuma poesia.” Talvez
seja exagero, não saberia dizer. Posso falar com mais propriedade sobre
a outra parcela do mundo, e concordo quando ele diz que, de maneira
geral, as humanidades se atêm a um conceito estreito de cultura, que não
inclui a ciência.
Os artistas e boa parte dos cientistas sociais são quase sempre cegos a
uma extensa gama do conhecimento. Numa passagem famosa de sua palestra,
Snow conta o seguinte: “Já me aconteceu muitas vezes de estar com
pessoas que, pelos padrões da cultura tradicional, são consideradas
altamente instruídas.

Essas pessoas muitas vezes têm prazer em expressar seu espanto diante da
ignorância dos cientistas. De vez em quando, resolvo provocar e pergunto
se alguma delas saberia dizer qual é a segunda lei da termodinâmica. A
resposta é sempre fria -e sempre negativa. No entanto, essa pergunta é
basicamente o equivalente científico de ‘Você já leu Shakespeare?’.

Hoje, acho que se eu propusesse uma questão ainda mais simples -por
exemplo: ‘Defina o que você quer dizer quando fala em ‘massa’ ou
‘aceleração”, o equivalente científico de ‘Você é alfabetizado?’-,
talvez apenas uma em cada dez pessoas altamente instruídas acharia que
estávamos falando a mesma língua”.

RESPONSABILIDADE Vivendo quase exclusivamente no hemisfério das
humanidades, recebo poucas notícias do lado de lá. O que eu teria a
dizer sobre ciência fica perto do zero. Por outro lado, como
especialista na minha própria ignorância, posso discorrer sobre ela sem
embaraços. Com as devidas ressalvas às exceções que devem existir por
aí, estendo minha ignorância a todo um grupo de pessoas e me pergunto de
quem seria a responsabilidade por sabermos tão pouco sobre as leis que
regem o que nos cerca.

As respostas são previsíveis. Em parte, a responsabilidade é dos
próprios cientistas, que não fazem questão de se comunicar com a
comunidade não-científica; em parte é dos governos, que raramente têm
uma política eficaz de promoção da ciência nas escolas; e em parte -e
essa é a parte que mais me interessa- é nossa, das humanidades, que
tomamos as ciências como um objeto estranho, alheio a tudo o que nos diz
respeito. A quase totalidade dos personagens de classe média da
literatura e do cinema brasileiro contemporâneos pertence ao mundo dos
artistas e intelectuais.

São jornalistas, escritores (geralmente em crise e com bloqueio),
professores (quase sempre de história, filosofia ou letras),
antropólogos, viajantes (à deriva), cineastas, atores, gente de TV ou
filósofos de botequim. Quando muito, um empresário aqui, um advogado
acolá. Para encontrar um engenheiro ou médico, é preciso voltar quase a
Machado de Assis. Cientistas são pouquíssimos, se bem que no momento não
me lembro de nenhum. (Os filmes de Jorge Duran são uma exceção, mas ele
nasceu no Chile.)

É como se, do lado de fora das disciplinas criativas, não houvesse
redenção. Em “Cidade de Deus”, o menino escapa do ciclo de violência
quando recebe uma máquina fotográfica e vira fotógrafo. Não parece
ocorrer a ninguém nem aos personagens, nem ao público a possibilidade
de ele virar biólogo, meteorologista ou mesmo técnico em ciência.

“Cidade de Deus” é uma narrativa realista, e portanto tende a preferir o
provável ao possível. Mas não é só isso. Nenhuma daquelas profissões
soaria suficientemente cool ao público -seria um anticlímax. Em nome da
eficácia narrativa, bem melhor ele virar artista. Eleição para a
Academia Brasileira de Letras dá página de jornal.

Já no caso da Academia Brasileira de Ciências, saindo da comunidade
científica, é improvável achar alguém que tenha pelo menos noção de onde
ela fica, que dirá saber o nome de algum acadêmico.

Há pouco tempo, escrevi o perfil de um jovem matemático carioca, Artur
Avila. Boa parte dos meus amigos alguns deles muito bem informados não
sabia da existência do Impa [Instituto Nacional de Matemática Pura e
Aplicada], sob vários aspectos a melhor instituição de ensino superior
do país (o número de artigos publicados em revistas de circulação
internacional de alto padrão científico, por exemplo, põe o Impa de par
em par com alguns dos grandes centros americanos de matemática, como
Chicago e Princeton).

DESCOLADOS Uma das minhas obsessões é folhear a revista dominical do
jornal “O Globo” . Existe ali uma seção na qual eles abordam jovens
descolados na saída da praia, de cinemas, lojas e livrarias, para
conferir o que andam vestindo. No pé da imagem, informa-se o nome e a
profissão da pessoa.

Um número recente trazia um designer, uma produtora de moda, um
estudante, uma dona de restaurante, um assistente de estilo, outra
designer, uma jornalista, uma publicitária, um “dramaturg” (estava assim
mesmo), uma estilista, outra estilista e alguém que exercia a misteriosa
profissão de “coordenadora de estilo”.

Acompanho essas páginas há um bom tempo, e estatisticamente o resultado
é assombroso. Conto nos dedos o número de engenheiros, médicos ou
biólogos que vi passar por ali. Eles não podem ser tão malvestidos
assim. De duas, uma: ou são relativamente poucos, ou a revista prefere
destacar as profissões que considera mais charmosas.

As duas alternativas são muito ruins, mas a segunda me incomoda
particularmente, pois sei por experiência como é poderosa a atração
exercida por algumas profissões com alto cachê simbólico.

Dou aula na PUC-Rio, no departamento de comunicação, que num passado
recente oferecia apenas cursos de jornalismo e publicidade. Durante
alguns anos, lecionei história do documentário para turmas de futuros
jornalistas. Em 2005 foi criada a especialização em cinema -e, hoje,
quase todos os meus trinta e poucos alunos são [sic] estudam cinema.

PESADELO Existem no Rio quatro universidades que oferecem cursos de
cinema; no Brasil, são ao todo 28, segundo o Cadastro da Educação
Superior do MEC. No ano passado, a PUC-Rio formou três físicos, dois
matemáticos e 27 bacharéis em cinema.

Existem 128 cursos superiores de moda no Brasil. Em 2008, segundo o Inep
[Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio
Teixeira], o país formou 1.114 físicos, 1.972 matemáticos e 2.066
modistas. Alimento o pesadelo de que, em alguns anos, os aviões não
decolarão, mas todos nós seremos muito elegantes.

É evidente que um país pode ter documentaristas demais e físicos de
menos. O Brasil já sofre uma carência de engenheiros. Segundo dados de
um relatório do Iedi [Instituto de Estudos para o Desenvolvimento
Industrial] entregue ao ministro da Educação, Fernando Haddad, a taxa de
formação de engenheiros no Brasil é inferior à da China, da Índia e da
Rússia, países emergentes com os quais competimos.

A Rússia forma 190 mil engenheiros por ano, a Índia, 220 mil e a China,
650 mil, diz o relatório. Nós formamos 47 mil. Os números da China são
pouco confiáveis, mas outras comparações eliminam possíveis dúvidas. A
Coreia do Sul, por exemplo, com 50 milhões de habitantes, forma 80 mil
engenheiros por ano, 26% de todos os formandos.

Na China, a crer nas métricas, essa proporção chega a 40%. Em 2006, a
taxa por aqui era de apenas 8%. Até o México, país com indicadores
sociais semelhantes aos nossos, hoje possui 14% de seus formandos nessa
área.

ESTAGNAÇÃO Companhias que integram a “Fortune 500″, lista das maiores
empresas do mundo, mantêm 98 centros de pesquisa e desenvolvimento na
China e outros 63 na Índia. No Brasil aparentemente não é feita esta
contagem; se o número existe, consegui-lo é uma proeza, o que só
confirma a pouca importância atribuída ao assunto. O relatório do Iedi
mostrou que os gastos totais em pesquisa e desenvolvimento como
proporção do PIB estão estagnados no país. Há cinco anos não cresce o
número de empresas que investem em desenvolvimento.

Em 2009, apesar da crise, a Toyota sozinha registrou mais de mil
patentes. A soma de todas as patentes requeridas pelas empresas
brasileiras não chegou à metade disso, segundo a Anpei [Associação
Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras]. Somos
detentores de 0,3% das patentes do planeta. Em termos de inovação,
ocupamos o 24º lugar entre as nações. O país prospera à força de
consumo, não de investimento ou invenção.

Compramos coisas que foram pensadas lá longe, as quais serão brevemente
superadas por outras coisas que também não terão sido pensadas aqui. É
um processo estéril. Escritores, cineastas e editores de suplementos
dominicais se espantariam em saber que, na China, a proficiência em
matemática desfruta de uma forte valorização simbólica.

Na Índia, um jovem programador de software se sente no topo do mundo. Há
pouco tempo, o jornalista Thomas Friedman, do “New York Times”, publicou
uma coluna sobre os 40 finalistas de um concurso promovido pela empresa
de processadores Intel, que premia os melhores alunos de matemática e
ciências do ensino médio americano.

Cada um deles solucionou um problema científico. Eis o nome dos jovens
americanos premiados: Linda Zhou, Alice Wei Zhao, Lori Ying, Angela
Yu-Yun Yeung, Kevin Young Xu, Sunanda Sharma, Sarine Gayaneh Shahmirian,
Arjun Ranganath Puranik, Raman Venkat Nelakant -assim prossegue a lista,
até terminar com Yale Wang Fan, Yuval Yaacov Calev, Levent Alpoge, John
Vincenzo Capodilupo e Namrata Anand.

VALORIZAÇÃO PÍFIA Enquanto isso, como lembra o matemático César Camacho,
diretor do Impa, várias universidades brasileiras têm vagas abertas para
professores de matemática, não preenchidas por falta de candidatos. A
valorização das ciências entre nós é pífia. Sempre me espanto com a
presença cada vez maior de projetos sociais que levam dança, música,
teatro e cinema a lugares onde falta quase tudo.

Nenhuma objeção, mas é o caso de perguntar por que somente a arte teria
poderes civilizatórios. Ninguém pensa em levar a esses jovens um
telescópio ou um laboratório de química ou biologia? Centenas de
estudantes universitários gostariam de participar de iniciativas assim.
Com entusiasmo e um pró-labore, mostrariam que a ciência também é
legal e despertariam talentos. Seria bom também se o nosso sistema
educacional fosse mais flexível, com cadeiras de humanidades e iniciação
científica no ciclo básico de todos os cursos universitários.

É imprudente tomar uma decisão definitiva aos 18 anos de idade, mas é
exatamente o que têm de fazer os alunos ao entrar na universidade
-embora, como norma, eles não saibam para o que têm vocação. Uma vez
escolhido o escaninho, somem as oportunidades de conhecer outras áreas e
eventualmente migrar.

Se em algum momento a vocação se manifesta, em geral o aluno e sua
família consideram que é tarde. Circunstâncias econômicas ou
psicológicas começar de novo exige determinação férrea dificultam
muito um ajuste de rota. (Sei bem como é, porque foi o meu caso.) É
absolutamente certo que, neste momento, alguns milhares de jovens estão
prestes a cometer o mesmo equívoco.

Muitos se revelarão apenas medianos ou preguiçosos, e é provável que a
ciência não tenha como alcançá-los. Sem desmerecer os excelentes alunos
de cinema, letras ou sociologia, é impossível negar que, para alguém sem
grande talento ou dedicação, será sempre mais fácil ser medíocre num
curso de humanas do que num de exatas.

Alguns desses jovens sem orientação provavelmente terão inclinação para
as ciências e ainda não descobriram. É preciso criar mecanismos que os
ajudem a escolher o caminho certo. Infelizmente, as artes e as
humanidades, pelo menos por enquanto, não colaboram muito. Ao contrário.
Nós disputamos esses jovens e, infelizmente, até aqui estamos ganhando a
guerra."




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Eu concordo que as ciências exatas têm sido pouco valorizadas, e que principalmente na escola, são as disciplinas que recebem menos apreço dos alunos.
Mas acredito que na escola, as exatas são apenas um bode expiatório, pois a maioria dos alunos acha uma perda de tempo estudar qualquer coisa...

Digo isso porque trabalho com adolescentes e mesmo disciplinas como a de sociologia - que estão sendo inseridas no currículo agora - são encaradas com o mesmo desmerecimento que as aulas de matemática vem recebendo historicamente.

Por isso, acredito que o problema não está só na diferença de valorização das áreas, mas sim na valorização do estudo em si, da busca de conhecimento. As escolas - salvo algumas exceções - são muito boas em arrancar de toda criança o prazer de conhecer as coisas - e isso vale pra qualquer assunto.

Um dos problemas é o sistema de mão única de ensino onde os alunos só recebem a informação, que faz com que eles vão deixando morrer a vontade de questionar, contestar, criticar... enfim, saber mais.

De fato, não se estuda porque é bom saber como as coisas do mundo funcionam, se estuda por ser uma obrigação. Se estuda (ou melhor, se decora) para passar no vestibular e assim um dia ser alguém na vida (isso acontece bastante aqui em santa maria, por causa da UFSM). E futuramente, essa pessoa vai ser um profissional que só sabe aquilo que compete à sua área, pois só quer saber aquilo que precisa para ganhar um salário no fim do mês.

Considerando que estamos falando das carreiras acadêmicas, acho ainda que existe outro problema. A sociedade dá pouco valor para aquelas pessoas que resolvem querer fazer do estudo o seu trabalho... Pois parece ser muito bem estabelecido que quem estuda, não trabalha.

Desse modo, não tendo incentivo para estudar nem na área que se escolhe, quem dirá querer saber sobre outras..
E assim, lá se vai a possibilidade de diálogo.

E ainda existe mais uma questão que não permite que as pessoas façam escolhas mais conscientes e mais satisfatórias...
Não é permitido pensar nas infinitas possibilidades do que se pode ser – de fato, dentro dessas possibilidades, poderia estar uma carreira nas exatas – mas isso só será considerado se tal escolha tiver alguma garantia de um retorno financeiro minimamente razoável - como dito antes.

E pode ser só minha opinião, mas pelas minhas observações até hoje, tenho a impressão de que um filósofo tem tão pouca valorização social quanto um matemático, e mais ou menos por esse mesmo motivo.

Posso inclusive dar o meu exemplo, pois quando disse para o meu pai que queria fazer psicologia, a primeira pergunta que ele fez foi, obviamente, se psicólogos ganham bem. Na realidade, ganhar bem com a psicologia é relativo, mas na época eu disse que sim, e ele achou que estaria tudo bem.

Agora, dando um exemplo que se encaixaria mais dentro das exatas, se um adolescente diz pro seu pai que quer ser astronauta, é estupidamente óbvio que o pai não vai levar a sério. falo disso, pois já vi uma situação assim.

Perguntou-se a um grupo de adolescentes o que cada um queria ser, e um deles disse que queria ser astronauta. Ele foi levado a sério, e não se sabia até o momento qual o valor que essa atitude teria. Surpreso, o adolescente logo se justificou dizendo que era uma brincadeira, e riu da situação com os colegas. Então, ele foi questionado: “mas por que não?”. E a resposta foi algo como que seria absurdo.. ou algo assim. Ao fim do trabalho, perguntando-se o que os adolescentes haviam achado das discussões, esse mesmo aluno respondeu: “eu gostei, porque quando eu disse que queria ser astronauta, vocês não deram risada, e ainda perguntaram por que não”.

Então, acho que a saída está em permitir que nossas crianças e adolescentes desenvolvam a sua curiosidade, o gosto pela busca de conhecimento, o gosto por saber como as coisas funcionam... e que seja permitido também que eles tentem ser aquilo que desejam - seja na área das humanas, seja na área das exatas.

O importante é que nunca se fechem pra nenhuma possibilidade, nem pra nenhum assunto... Acho que assim, não teríamos só um equilíbrio numérico de profissões, mas também teríamos profissionais mais satisfeitos com suas vidas.

Pois o que observo é que as escolhas feitas pelos adolescentes de hoje são muito mal pensadas e apressadas, e feitas por todos os motivos errados...
E talvez seja por isso que temos mais estudantes de moda do que físicos, matemáticos e engenheiros...
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Só de Sacanagem

"Meu coração está aos pulos!

Quantas vezes minha esperança será posta à prova?

Por quantas provas terá ela que passar? Tudo isso que está aí no ar, malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro, do meu, do nosso dinheiro que reservamos duramente para educar os meninos mais pobres que nós, para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais, esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais.

Quantas vezes, meu amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova?

Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais?

É certo que tempos difíceis existem para aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz.

Meu coração está no escuro, a luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e os justos que os precederam: "Não roubarás", "Devolva o lápis do coleguinha", "Esse apontador não é seu, minha filha". Ao invés disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar.

Até hábeas corpus preventivo, coisa da qual nunca tinha visto falar e sobre a qual minha pobre lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará. Pois bem, se mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou sacanear: mais honesta ainda vou ficar.

Só de sacanagem! Dirão: "Deixa de ser boba, desde Cabral que aqui todo mundo rouba" e vou dizer: "Não importa, será esse o meu carnaval, vou confiar mais e outra vez. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos, vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês. Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e o escambau."

Dirão: "É inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal". Eu direi: Não admito, minha esperança é imortal.

Eu repito, ouviram? Imortal! SEI QUE NÃO DÁ PARA MUDAR O COMEÇO MAS, SE A GENTE QUISER, VAI DAR PARA MUDAR O FINAL!"

[Elisa Lucinda]

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